“Estilhaços de uma razão encarnada”: a crítica que sustenta a teoria crítica da constituição
Revista de Direito da Faculdade Guanambi | Guanambi | v. 9 | n. 01 | e18807 | jan./jun. | 2022 | Página 3 de 26
https://doi.org/10.59306/rdfg.v9i01.18807
1937 para descrever o projeto de trabalho do Instituto de Pesquisas Sociais de
Frankfurt. Definida contra a concepção tradicional de teoria que governa as ciências
(incluindo as ciências sociais ou humanas, como a sociologia), e sua noção de que a
teoria é um sistema de proposições abstratas (ou seja, a-históricas, as-subjetivas e
as-sociais), passíveis de serem verificadas empiricamente, a teoria crítica sustenta
que o conhecimento científico é histórico, em certa medida subjetivo e,
certamente, social.
A tentativa de separar os conceitos de seus produtores dá origem ao que
Horkheimer se referiu como razão instrumental. Assim, a teoria crítica está, em
última análise, preocupada com o que é possível saber, dado que o status ontológico
(seja do sujeito, seja do objeto da teoria) jamais pode ser dado como certo. A
palavra crítico deve, assim, ser entendida em oposição, inspirada na obra de
Immanuel Kant, ao termo analítico: refere-se ao conjunto de conceitos cujo alcance
é sempre e necessariamente maior do que sua compreensão.
Não podemos ver, segurar ou pensar adequadamente algo tão vasto quanto
o universo em sua totalidade, por exemplo, mas sem o conceito de universo não
poderíamos nos situar no tempo e no espaço. O mesmo pode ser dito de conceitos
como direito, mas também nação, sociedade, comunidade, política, etc., todos
necessários para pensar o mundo, embora nenhum seja verificável em sentido
estritamente científico. Em geral, a teoria crítica explora as conexões,
sobreposições, interseções e interferências entre as três esferas do desenvolvimento
econômico, da vida psíquica e da cultura.
O ponto de partida da teoria crítica, derivada em parte de Karl Marx, mas
também inspirada em Émile Durkheim e Max Weber, é a modernidade como processo
de grande transformação do mundo ocorrido em meados do século XIX. Isso acarreta
três consequências: a tradição não pode ser usada como guia para pensar nem o
presente, nem o futuro; a sociedade se estilhaçou em subsistemas semi-autônomos
(por exemplo, o mercado, as várias profissões, a indústria), tornando difícil, ainda
que necessário, encontrar maneiras de falar do todo; o bom, o verdadeiro e o belo
foram desagregados, apresentando novos desafios à ética, à filosofia e à estética.
Sob tais condições, a teoria crítica, sobretudo a sua primeira geração,
interessou-se nos motivos pelos quais a sociedade humana falhou em cumprir a
promessa do esclarecimento e se tornou desigual, injusta e em grande parte cética,
cínica, indiferente. Testemunhas da barbárie da Primeira e da Segunda Guerras
Mundiais, a primeira geração de teóricos críticos talvez possa ser perdoada pela